O enorme investimento em infraestrutura de inteligência artificial que está sendo feito provavelmente já conta como a implementação mais rápida e abrangente de uma tecnologia de uso geral da história.
Neste ano e no próximo, Google, Amazon, Microsoft e Meta, sozinhas, gastarão impressionantes US$ 750 bilhões em data centers para alimentar seus modelos de IA. O Morgan Stanley prevê que o gasto global total nessa área alcance US$ 3 trilhões até 2029.
Mas investidores cautelosos estão perguntando cada vez mais: que retorno esse imenso desembolso de capital vai gerar? A história sugere que eles têm razão em estar nervosos.
Poucos estudiosos são melhores para colocar a IA em perspectiva histórica do que Carlota Perez, autora de “Technological Revolutions and Financial Capital: The Dynamics of Bubbles and Golden Ages” [“Revoluções Tecnológicas e Capital Financeiro: A Dinâmica das Bolhas e das Eras de Ouro”].
Em seu livro, Perez identifica cinco grandes revoluções tecnológicas: a revolução industrial do fim do século 18; a revolução do vapor, carvão e ferrovias nos anos 1830; a do aço e da engenharia pesada nos anos 1870; a era da produção em massa no início do século 20 e a revolução da tecnologia da informação a partir dos anos 1970. Perez vê a IA como uma extensão dessa quinta revolução tecnológica.
Ela também argumenta que essas revoluções seguem um ciclo relativamente previsível. Uma fase inicial de instalação resulta em muita destruição criativa e disrupção social, à medida que indústrias e regiões são abaladas. Isso normalmente vem acompanhado de excesso de investimento, mania financeira e bolhas no mercado acionário.
Ainda assim, essas bolhas muitas vezes são produtivas, financiando a construção de infraestrutura vital que permite a posterior adoção em massa da tecnologia —como quando ferrovias ou redes elétricas foram erguidas— e seus benefícios econômicos mais amplos se realizam. No caso da IA, ainda estamos nessa fase maníaca de instalação.
Essa ideia foi reforçada por um relatório do Massachusetts Institute of Technology que preocupou investidores nesta semana. Pesquisadores constataram que 95% das empresas entrevistadas não estão obtendo retorno algum de seus investimentos em IA generativa
Sam Altman, presidente-executivo da OpenAI, tampouco tranquilizou o mercado quando questionado se havia uma bolha de IA: “Acho que alguns investidores provavelmente vão perder muito dinheiro”, respondeu.
Uma queda brusca —ou várias—, portanto, parece provável antes que cheguemos a qualquer era dourada da IA. “Nunca vi uma era dourada acontecer sem um crash”, diz Perez com naturalidade.
E, ainda mais animador, ela acrescenta que o estouro da bolha da IA pode provocar abalos ainda maiores, já que os mercados de capitais estão funcionando de forma distorcida.
Hoje eles se concentram mais em jogos especulativos, como as criptomoedas, do que em investimentos produtivos, enquanto a dívida global já equivale a mais de três vezes o PIB mundial. “Isso também pode ser um gatilho para uma instabilidade gigantesca”, afirma.
Vale a pena, porém, que os investidores considerem como esta revolução tecnológica pode diferir dos ciclos anteriores. É certamente a primeira revolução impulsionada tanto por software quanto por hardware. Isso muda a dinâmica financeira, já que entram em cena poderosos efeitos de rede. Empresas de software podem escalar mais rápido e se globalizar da noite para o dia.
O ChatGPT, da OpenAI, é usado por 700 milhões de pessoas toda semana três anos após seu lançamento. Mas se a globalização digital aumenta oportunidades, também amplia riscos. Basta ver como o modelo chinês DeepSeek, mais barato, sacudiu investidores em ações de tecnologia nos EUA.
Talvez a diferença mais intrigante, no entanto, seja até que ponto as empresas de IA conseguirão se beneficiar diretamente dos ganhos financeiros que ajudarem a gerar. A tecnologia já acelera avanços em diversas áreas —biotecnologia, robótica e ciência de materiais, por exemplo.
Empresas de IA podem explorar sua vantagem tecnológica para se tornarem também companhias de saúde, descobrir medicamentos ou pilotar carros autônomos. Até que ponto elas poderão se transformar em empresas de uso geral e capturar os frutos dessa era dourada?
Uma outra lição importante, porém, deve ser tirada das revoluções anteriores, acrescenta Perez. Para entrar em uma era dourada, a sociedade civil precisa moldar a revolução em função de seus próprios interesses.
Assim, políticos no passado criaram agências antitruste para conter empresas excessivamente poderosas e ergueram estados de bem-estar para suavizar a disrupção no mercado de trabalho.
Perez argumenta que os mercados financeiros disfuncionais de hoje, a concentração de poder corporativo, a ascensão do populismo e a ameaça da mudança climática colocaram o mundo diante de um novo ponto de inflexão. Como responder a isso é o tema de seu próximo livro.
No entanto, como escreveu o historiador AJP Taylor sobre as revoluções de 1848 na Europa, países às vezes chegam a pontos de virada —e falham em virar.