Para um restaurante instalado em Veneza, a localização não poderia ser mais emblemática: a praça San Marco, incontornável cartão postal da cidade. Tal como seu endereço, o restaurante Quadri é também carregado de história. O café, no térreo, nasceu em 1775, e se mantém até hoje, junto com o bistrô Quadrino e tendo o restaurante (este, de 1830) ocupando o andar superior.
A decoração e o cardápio, porém, ainda que respeitosos com a tradição, carregam fortemente o sinal dos novos tempos, modernizados que foram nos últimos quinze anos. Desde 2011 o local pertence aos irmãos Massimiliano e Raffaele Alajmo (Max e Raf), respectivamente chef e diretor do aclamado restaurante Le Calandre, em Pádua, também na mesma região do Veneto, mas a cinquenta quilômetros dali.
O Le Calandre foi fundado pelos pais deles em 1981; os irmãos assumiram em 1994. Em 2002 Max, com 28 anos, foi o mais jovem chef a receber a terceira estrela Michelin. Hoje a família tem 14 restaurantes pelo mundo.
Em Veneza, o Quadri (com uma estrela Michelin) ganhou uma nova cara com a reforma concluída em 2018. A majestade e a essência do edifício e de inúmeros detalhes históricos seguem ali. Mas, ao mesmo tempo que tudo passou pelas mãos de artesãos e restauradores venezianos, também teve a concepção disruptiva do designer francês Philippe Starck.
Como definem os proprietários, a magia e o romantismo do lugar, sem perder sua alma veneziana, ganhou uma atmosfera levemente surrealista. Por exemplo: se os batentes das janelas retomaram o velho brilho para descortinar a antiga glória da praça, lá dentro, das paredes, nos miram coelhos e raposas empalhados –com um detalhe desconcertante: eles têm asas, lembrando o leão alado que é símbolo de Veneza.
Mas o jogo entre o antigo e o novo corresponde à cozinha de Alajmo, que faz de tudo para trazer referências evidentes às tradições culinárias italianas (e no caso, venezianas), buriladas com suas interpretações contemporâneas. No caso do Quadri, brilham os maravilhosos ingredientes da laguna, pescados a cada dia, assim como os vegetais da verdejante ilha de Santo Erasmo.
Executados pelos chefes Silvio Giavedoni e Sergio Preziosa, o restaurante oferece dois menus-degustação de oito passos a 260 euros, e um terceiro –o menu de caviar— por 350 euros. O caviar não é da laguna, mas é uma referência histórica à região, que há 500 anos foi importante entreposto do produto.
Dois testemunhos são os quadros de pintores locais: de Tintoretto (1518-1594), A Criação dos Animais, onde esturjões (peixes que produzem as ovas do caviar) pululam nas águas; e de Carpaccio (1465 — 1525), O Milagre da Relíquia da Cruz na Ponte de Rialto, onde aparece o símbolo do Hotel Esturjão (Locanda Sturion, que existe até hoje).
Estive no Quadri no outono europeu, então dá-lhe cogumelos e caça –brusqueta com tartar de carne e trufa branca, risoto ao sugo de lebre, cogumelo e molho tartufado de levedura, miolo de contra-filé em crosta de cereais com mil-folhas de vegetais e trufa negra…
Mas entre os três menus há numerosas opções (que também podem ser pedidas à la carte, em quantidades e preços menores). São famosos o cappuccino da laguna, com camarões e caranguejos locais; e o siri mole frito servido com grelo e creme de ostra.
Outras opções, mas a depender da época do ano, são ravioli de burrata com frutos do mar; risoto com enguia defumada com sorvete de estragão e suco de beterraba; e sobremesas como o sorbet de grapefruit rosa e o wafer de mont blanc.
Ristorante Quadri – Praça San Marco, 121, Veneza (Itália)
Tel. +39 041 5222105.
Reservas, https://alajmo.it./