Nvidia e AMD concordam em repassar 15% da receita com vendas de chips na China ao governo dos Estados Unidos, como parte de um acordo incomum com o governo Trump para obter licenças de exportação dos semicondutores.
As duas fabricantes de chips concordaram com esse acordo financeiro como condição para obter as licenças de exportação para o mercado chinês, que foram concedidas na semana passada, segundo pessoas familiarizadas com a situação, incluindo um funcionário do governo dos EUA.
O funcionário afirmou que a Nvidia concordou em compartilhar 15% da receita com vendas do chip H20 na China, e a AMD fará o mesmo com a receita do chip MI308. Duas pessoas com conhecimento do acordo disseram que o governo Trump ainda não decidiu como o dinheiro será utilizado.
O jornal Financial Times informou na sexta-feira (8) que o Departamento de Comércio começou a emitir licenças de exportação para o H20 também na sexta-feira, dois dias após o CEO da Nvidia, Jensen Huang, se encontrar com o presidente Donald Trump. O funcionário dos EUA afirmou que o governo também começou a emitir licenças para o chip chinês da AMD.
Esse tipo de acordo de “toma-lá-dá-cá” é inédito. Segundo especialistas em controle de exportações, nenhuma empresa dos EUA jamais concordou em pagar parte de sua receita para obter licenças de exportação. No entanto, o acordo se encaixa no padrão da administração Trump, onde o presidente pressiona empresas a tomarem certas medidas — como investimentos domésticos — para evitar tarifas, em um esforço de gerar empregos e receita nos EUA.
A AMD não respondeu aos pedidos de comentário. A Nvidia não negou que tenha aceitado o acordo. Em comunicado, afirmou: “Seguimos as regras estabelecidas pelo governo dos EUA para nossa atuação em mercados globais.”
Analistas da Bernstein estimam que, com base nas projeções da Nvidia antes das restrições entrarem em vigor no início deste ano, a empresa venderia cerca de 1,5 milhão de chips H20 para a China em 2025, gerando aproximadamente US$ 23 bilhões em receita.
Essa medida surge após a polêmica envolvendo o chip H20. A Nvidia desenvolveu o H20 especialmente para o mercado chinês após o presidente Joe Biden impor controles rígidos de exportação sobre chips mais avançados usados em inteligência artificial.
Em abril, o governo Trump anunciou que proibiria a exportação do H20 para a China. No entanto, Trump voltou atrás em junho após se reunir com Huang na Casa Branca. Nas semanas seguintes, a Nvidia demonstrou preocupação porque o Bureau of Industry and Security (BIS), órgão do Departamento de Comércio responsável pelos controles de exportação, ainda não havia emitido licenças.
Huang levantou a questão com Trump na quarta-feira, segundo fontes familiarizadas com o encontro, e o BIS começou a emitir licenças na sexta-feira.
O acordo sobre a receita do H20 surge em meio a críticas direcionadas à Nvidia e à administração Trump pela decisão de vender o chip à China. Especialistas em segurança dos EUA afirmam que o H20 pode ajudar as forças armadas chinesas e enfraquecer a liderança dos EUA em inteligência artificial.
“Pequim deve estar se deleitando ao ver Washington transformar licenças de exportação em fontes de receita”, disse Liza Tobin, especialista em China que atuou no Conselho de Segurança Nacional durante o primeiro governo Trump. “O que vem depois —permitir que a Lockheed Martin venda caças F-35 para a China por uma comissão de 15%?”
Alguns funcionários do BIS também expressaram preocupação com essa reversão, segundo pessoas a par da situação.
Em uma carta recente ao secretário de comércio Howard Lutnick, Matt Pottinger — especialista em China e ex-vice-assessor de segurança nacional no primeiro mandato de Trump — e outros 19 especialistas em segurança pediram que os EUA não concedessem licenças para o H20.
Eles afirmaram que o H20 é um “acelerador potente das capacidades de IA de ponta da China” e acabaria sendo usado pelo exército chinês. A Nvidia rebateu, chamando as alegações de “equivocadas” e rejeitando a ideia de que o H20 pudesse ser utilizado para fins militares.
No sábado, a Nvidia declarou: “Embora não tenhamos enviado chips H20 para a China há meses, esperamos que as regras de controle de exportações permitam que os EUA concorram na China e no mundo. Os EUA não podem repetir o erro do 5G e perder a liderança em telecomunicações. A pilha tecnológica de IA dos EUA pode se tornar o padrão mundial — se corrermos.”
O debate em Washington sobre a política de controle de exportações de chips ocorre em um momento em que os EUA e a China estão em negociações comerciais que Trump espera que levem a uma cúpula com o presidente chinês Xi Jinping. O FT já havia relatado que o Departamento de Comércio foi orientado a suspender novos controles de exportação à China para evitar antagonizar Pequim.
As preocupações de que Trump possa flexibilizar os controles para agradar a China surgem no momento em que Pequim pressiona por um afrouxamento das restrições sobre chips de memória de alta largura de banda (HBM), um componente crucial para a fabricação de chips avançados de IA.