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O governo Lula 3 tem a oportunidade —e os instrumentos— para corrigir um dos maiores mal-entendidos recentes sobre a Lei de Acesso à Informação (LAI): o chamado “sigilo de 100 anos”. E pode fazê-lo sem arriscar ser lembrado como o governo que abriu brecha para o enfraquecimento da principal lei de transparência do país.
Antes de tudo, é preciso esclarecer: “sigilo de 100 anos” não existe. Já tentamos explicar a impropriedade do termo em diversas ocasiões, mas a expressão pegou. E até nós, nesta coluna, fazemos aqui nossa mea-culpa. Mesmo que sempre entre aspas, acabamos recorrendo a ela para dialogar com o vocabulário que se popularizou. O problema é que o termo atrapalha o debate público e cria ruído onde há um impasse objetivo e solucionável: a falta de critérios claros para o uso da justificativa de proteção de dados pessoais como argumento para negar acesso a informações públicas. Justamente com o objetivo de evitar que essa confusão se perpetue, publicamos nesta semana, com outras organizações, uma nota com orientações claras sobre como falar mais adequadamente acerca desse tema.
A LAI prevê apenas três tipos de sigilo: reservado (cinco anos), secreto (15 anos) e ultrassecreto (25 anos). E ainda: não se trata de meras negativas de pedidos de informações, mas sim processos formais de classificação sigilosa com procedimentos claros e, legalmente, delimitados.
O que se convencionou chamar de “sigilo de 100 anos” são, na verdade, restrições de acesso baseadas na interpretação de que determinada informação tem caráter pessoal. Em alguns casos, essa justificativa é legítima. Em outros, claramente usada de forma excessiva ou indevida. O fundamento para isso está no artigo 31 da LAI, dispositivo que, por sua vez, não preconiza o prazo de um século como automático e sim como “prazo máximo”. Ou seja, é “ATÉ” e não “por 100 anos”.
Portanto, não é necessário alterar o texto da lei. Basta uma atualização, por meio de um decreto presidencial, indicando, de forma clara, quais os limites temporais intermediários que devem ser seguidos nesse espectro. E alinhar as limitações de objeto a partir da jurisprudência já consagrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e Tribunal de Contas da União (TCU).
Em entrevista à coluna, o cientista político Dalson Figueiredo, professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e pesquisador do Berkeley Initiative for Transparency in the Social Sciences, afirmou que seria imprudente da parte do governo abrir a LAI para discussão no Congresso nesse momento. Na avaliação do especialista, “pequenas alterações de redação —feitas em comissões ou emendas de plenário— podem mudar substancialmente o alcance e a efetividade da lei. Como diz o provérbio, o diabo está nos detalhes”.
A questão é também de precedente. Desde sua sanção, em 2011, a LAI nunca foi alterada pelo Congresso. Uma vez aberto esse caminho, será difícil impedir que futuros governos —com intenções menos republicanas— façam o mesmo.
Figueiredo ressalta ainda que a conjuntura política nacional e internacional em 2011, quando a LAI foi aprovada, era outra. “Hoje o cenário é de alto risco de enfraquecimento da legislação. O governo não deveria pagar para ver.”
O governo Lula 3 fez avanços importantes na transparência pública, como a criação do Painel de Licitações, a reformulação do Painel de Correição e a publicação, pela CGU, de dezenas de excelentes enunciados para melhorar a aplicação da LAI. A criação da Dirbi —Declaração de Incentivos, Renúncias, Benefícios e Imunidades Tributárias— é um marco no controle dos gastos tributários por CNPJ e responde a uma demanda histórica da sociedade civil.
Não é preciso abraçar agora o risco de serem lembrados pelos retrocessos em uma das ferramentas democráticas mais poderosas desde a Constituição Federal de 1988. Há caminhos mais seguros —e mais eficazes— ao alcance do Executivo.
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